Programa de Alimentação do Trabalhador: os impactos da nova lei, os riscos da distorção e o papel do bom senso.
Por: Leila Perez - Cofundadora
Nos últimos anos, o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) passou por transformações significativas. Algumas dessas mudanças representam avanços importantes, enquanto outras ainda exigem atenção, reflexão e cautela.
Com mais de duas décadas de atuação no segmento de benefícios corporativos, acompanhamos de perto essa evolução. Desde sempre, nos posicionamos claramente contra práticas que distorcem o propósito original do programa, como o uso de rebates, felizmente agora proibido por lei.
Fim dos rebates: uma vitória pela integridade no PAT
O chamado rebate, prática de oferecer vantagens financeiras às empresas contratantes em troca do fornecimento de benefícios, foi, por anos, uma grave distorção do sistema. Embora amplamente praticada, sempre defendemos a transparência nas soluções de benefícios corporativos.
A Portaria nº 1.707/2024, que regulamenta o PAT, veio reforçar um princípio essencial: o valor do benefício pertence ao trabalhador. Ele deve recebê-lo integralmente, sem descontos ocultos ou retornos indevidos a terceiros.
Vale-alimentação não é moeda de troca
Outro ponto relevante da nova legislação é a reafirmação da vedação ao uso do vale-alimentação para finalidades não alimentares como saúde, lazer, cursos ou estética.
Apesar de ser uma medida válida, sua implementação é complexa. Com a aceitação ampliada de bandeiras genéricas de cartão alimentação, o risco de transformar o benefício em uma moeda de uso livre é crescente, o que descaracteriza sua função original.
Transformar um benefício essencial em um meio de pagamento irrestrito é caminhar para a extinção silenciosa do programa. O que pode parecer vantajoso comercialmente é, na verdade, um afastamento do seu compromisso social.
Nutricionista responsável técnico: peça-chave na integridade do PAT
Conforme a legislação do Programa de Alimentação do Trabalhador, toda operadora deve contar com um nutricionista responsável técnico, devidamente registrado no programa e vinculado ao Conselho Regional de Nutrição.
Esse profissional exerce funções fundamentais:
Inspecionar a rede credenciada;
Garantir condições higiênico-sanitárias e nutricionais adequadas;
Promover palestras e assistência nutricional aos trabalhadores;
Avaliar cardápios e incentivar a educação alimentar.
Cumprimos essa exigência com seriedade. Nossa nutricionista atua ativamente, orientando os estabelecimentos credenciados, fiscalizando padrões e oferecendo suporte direto a empresas e colaboradores.
No entanto, à medida que o vale-alimentação passa a ser aceito em qualquer loja ou segmento não destinado à alimentação, o controle técnico e nutricional se torna inviável.
Seriam necessários centenas de nutricionistas para garantir a fiscalização de todos os pontos de aceitação, contrariando a própria lógica da legislação do PAT, comprometendo sua eficácia.
Benefício corporativo precisa ser pensado com bom senso.
É fundamental tratar o cartão alimentação com responsabilidade. Para muitos trabalhadores, especialmente os de menor renda — o vale-alimentação representa a garantia de uma refeição em casa. Para outros perfis, com salários mais altos ou acesso a benefícios complementares, esse valor pode ser direcionado a gastos supérfluos.
É justamente por isso que o bom senso deve nortear as decisões. Não podemos nivelar a necessidade alimentar de quem está na base da pirâmide com a conveniência de públicos mais privilegiados.
O PAT não deve ser pensado somente para atender grandes centros urbanos ou ambientes corporativos elitizados. Ele precisa ser funcional para a realidade do Brasil, onde o acesso à alimentação básica ainda é um desafio.
Por um PAT justo, transparente e humano.
Apoiar o PAT vai muito além da adesão formal ao programa. É proteger um direito social, reconhecendo que, enquanto alguns escolhem onde jantar, outros ainda lutam para garantir o almoço dos filhos.
Ignorar essa realidade é negligenciar a desigualdade brasileira.
Defendemos um modelo de Programa de Alimentação do Trabalhador que seja eficiente, fiscalizável, socialmente justo, transparente e, acima de tudo, humano.